A história do bacalhau pelo mundo
Mais associado às receitas portuguesas, este peixe do Atlântico Norte faz sucesso em diversas culturas gastronômicas
Bacalhau à Gomes de Sá, à Lagareiro, à Zé do Pipo, à Brás, à Vasco da Gama. É longa e apetitosa a lista das receitas portuguesas elaboradas com este peixe de águas frias, salgado após a sua pesca. Mas, apesar da forte ligação do pescado norueguês com a cultura lusitana, o bacalhau não é uma exclusividade dos portugueses. Na verdade, este peixe, que salgado e seco recebe o nome de bacalhau, é resultado da fusão de várias culturas gastronômicas ao longo dos séculos, que são traduzidas na forma dos mais diversos pratos, dos conhecidos portugueses aos ingleses, italianos e agora até japoneses.
O começo de tudo está na Noruega. É nas águas do Atlântico Norte, quase no polo, que banham este país gelado que vivem os peixes do gênero Gadus, pertencentes à família Gadidae - deles todos, o Gadus morhua é o mais cobiçado. Os vikings foram os primeiros a descobrilo, pescando e secando o peixe, então chamado de stokfisk, num processo que permitia conservá-lo por até cinco longos anos. Depois vieram os bascos. Ao contrário dos noruegueses, eles dominavam a técnica da salga com perfeição. O bacalhau ganhou muito mais sabor quando passou a ser salgado antes de seco. Os vikings, no início, faziam o processo inverso, o que resultava em um peixe esturricado, que precisava de pelo menos uma semana para ser dessalgado, mas que era alimento saudável e garantido em suas longas viagens marítimas.
Junto com a salga, os pescadores também aprenderam a encontrar lugares com muito vento para secar o peixe. Os bascos preferiam o mar Cantábrico, perto de casa, mas os ingleses, que também descobriram o peixe nessa época, iam a portos mais ao norte. "Do século 15 em diante, navegadores de vários países começaram a pescar o bacalhau, mas era tudo feito em segredo, ninguém revelava para ninguém onde pescava ou secava o seu peixe", conta Heloisa Bacellar, experiente cozinheira e que lança, ainda neste ano, um livro de receitas sobre o bacalhau em diversas culturas com o nome Bacalhau, receitas e histórias - das águas geladas às caçarolas, pela DBA Editora. Venezianos, holandeses, bretões, portugueses, entre outros, entraram nesta pescaria, então farta no final do inverno e na primavera, quando os animais nadavam mais na superfície à procura de comida e acasalamento.
Heloisa Bacellar, autora das receitas |
Nesta caça ao bacalhau, o peixe foi sendo incorporado às mais diversas cozinhas. A seu favor, destaca Heloisa, que levantou toda a história do peixe para escrever o livro, estão a longa durabilidade do pescado, seu alto valor nutritivo e o preço (os mais abastados compravam as postas e lombos, mas as aparas eram comercializadas por valores mais em conta). O resultado desta expansão reflete nas receitas escolhidas por Heloisa e André Berti, seu fiel cozinheiro, para ilustrar esta reportagem. Portugal (com uma receita mais moderna), País Basco, Itália, Inglaterra e França estão representados nos pratos a seguir, em modos de preparo bastante diversos dos conhecidos bacalhaus ao forno.
É só conferir: as tapas espanholas estão no bolinho de bacalhau, preparado com pedaços inteiros do peixe e não desfiados, como é hábito no Brasil e em Portugal. Da Itália, uma salada com o pescado, inspirada nos pratos mediterrâneos (bem diferentes das receitas do norte do País, em que o peixe é envolto em molhos cremosos).
Da França, Heloisa se inspirou no provençal tian, feito com muitos legumes em camadas, aqui intercaladas com o peixe. De Portugal, o arroz de bacalhau ganha a companhia de maçãs caramelizadas. E, por fim, a criação inglesa leva o peixe ao forno e é finalizada com biscoitos em farelos. São boas sugestões para quem quer comemorar a Páscoa com uma receita diferente.
Sem sal
Não há livro de receita que não traga uma dica de como tirar o sal do bacalhau. Colocar a posta na água pura, no leite ou na água com sal são apenas os mais comuns. Quando começou a preparar as receitas para o seu livro, Heloisa, auxiliada por Berti, decidiu testar 20 métodos diferentes de dessalgar o peixe. E a dupla agiu cientificamente: dessalgou 20 postas do mesmo tamanho seguindo cada um dos métodos de dessalga. Em todas elas, foram anotados o peso (inicial e final), a quantidade de água usada no processo e o teor de sal no final. A conclusão caminha para a simplicidade: "Os resultados são muito parecidos em sua eficácia e sabor do peixe", afirma Berti. A sugestão é partir para o clássico dessalgue com água, que é também o mais barato. Aqui, Berti diz para cobrir o peixe com água, deixá-lo na geladeira e ir trocando a água a cada seis horas. Para uma posta de 4 centímetros de altura, são necessários dois dias e meio de trabalho. Para saber se o peixe está dessalgado, deve-se provar um pedaço da carne no interior do lombo.
caçarola inglesa de bacalhau
crackers
1 3/4 xícara (chá) de farinha de trigo; 1 colher (chá) de sal; 1 colher (chá) de fermento em pó; 50 g de manteiga gelada em cubinhos; 1/2 xícara (chá) de creme de leite espesso (em lata ou em caixinha); sal grosso em cristais miúdos para salpicar; manteiga para untar; farinha para polvilhar
bacalhau
1 kg de lombo de bacalhau em cubos grandes, sem pele, sem espinhas e dessalgado por aproximadamente 48 horas; 1 kg de batata cozida em cubos grandes; 1 talo de alhoporó em rodelinhas finas; 2 xícaras (chá) de leite; manteiga para untar; sal a gosto
crackers unte com manteiga 2 assadeiras grandes. Em uma tigela média, misture a farinha, o sal e o fermento. Junte a manteiga e trabalhe com a ponta dos dedos até conseguir uma farofa. Acrescente o creme de leite, misture até obter uma massa macia e que descole das mãos, envolva em filme plástico e leve à geladeira por 15 minutos. Sobre uma superfície enfarinhada, abra a massa com um rolo até ficar bem fininha, como uma casca de banana. Com uma faca afiada, divida em 30 quadrados de uns 3 cm, passe para as assadeiras, perfure cada quadrado em dois ou três lugares com um garfo, salpique o sal grosso e leve à geladeira por uns 10 minutos, enquanto o forno aquece a 180ºC (médio). Asse os crackers por 15 minutos, até que estejam dourados e crocantes. Deixe esfriar sobre uma grelha, separe 10 crackers para a preparação do bacalhau e guarde os demais para outra preparação num pote bem fechado por até três dias. Quebre os 10 crackers com as mãos em pedacinhos miúdos, junte os cubinhos de manteiga e esfarele com a ponta dos dedos até conseguir uma farofa grossa.
caçarola unte com manteiga um refratário médio, espalhe na base o alho-poró e cubra com os cubos de bacalhau e de batata. Polvilhe as batatas com um pouquinho de sal, regue tudo com o leite e leve ao forno por 20 minutos, até que o bacalhau esteja macio e se separando em lascas. Retire o refratário do forno, espalhe por cima a farofa dos crackers e volte ao forno por mais 10 minutos para dourar.
dica do chef se quiser, acrescente rodelas de cenoura e ervilhas (frescas ou congeladas), além da batata.
rendimento 6 porções
preparo 1h30 (+ 48 horas para dessalgar o bacalhau)
execução moderada
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